4) "Da mesma forma, chegam-me notícias de que tal ou qual colega marcou consultas com um paciente para fazer com ele um tratamento psíquico, embora eu tenha certeza de que ele não conhece a técnica de tal tratamento. Deve estar esperando, portanto, que o paciente o presenteie com seus segredos, ou talvez esteja buscando a cura em alguma espécie de confissão ou confidência. Não me surpreenderia que um paciente assim tratado extraísse disso mais prejuízos do que benefícios. É que o instrumento anímico não é assim tão fácil de tocar. Nessas ocasiões, não posso deixar de pensar nas palavras de um neurótico mundialmente famoso, que decerto nunca esteve em tratamento com um médico, pois viveu apenas na fantasia de um poeta. Refiro-me a Hamlet, Príncipe da Dinamarca. O Rei enviara dois cortesãos, Rosenkranz e Guildenstern, para sondá-lo e arrancar dele o segredo de seu desgosto. Ele os repele; aparecem então algumas flautas no palco. Tomando uma delas, Hamlet pede a um de seus algozes que a toque, o que seria tão fácil quanto mentir. O cortesão se recusa, pois não conhece o manejo do instrumento, e, não conseguindo persuadi-lo a tentar, Hamlet finalmente explode: "Pois vede agora em que mísera coisa me transformais! Quereis tocar-me; (...) quereis arrancar o cerne de meu mistério; pretendeis extrair-me sons, de minha nota mais grave até o topo de meu diapasão; e embora haja muita música, excelente voz neste pequenino instrumento, não podeis fazê-lo falar.